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Câmeras, iluminação e guardas falharam em prisão, admite Lewandowski

Bandidos que escaparam da cadeia federal em Mossoró pegaram alicate do canteiro de obra

BERNARDO LIMA E EDUARDO GONÇALVES brasil@oglobo.com.br BRASÍLIA

O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, admitiu ontem que câmeras, detectores de movimento, projeto de iluminação e arquitetura e agentes “mais relaxados” no carnaval falharam, abrindo uma série de “coincidências negativas e casos fortuitos” que permitiram a fuga de dois bandidos do presídio de Mossoró (RN) na quarta-feira. Ao menos nove erros ficam evidentes quando se repassam as informações disponíveis sobre a dinâmica da saída. Para cortar o gradil que separa a cadeia da rua, por exemplo, os criminosos usaram um alicate da obra de reforma largado no pátio. O ministro anunciou que serão construídas muralhas ao redor das quatro prisões federais que não têm a proteção e implementados novos sistemas de alarme e de reconhecimento facial nas cinco unidades. As buscas pelos fugitivos continuavam ontem num raio de 15 quilômetros da cadeia.

Aprimeira fuga em uma penitenciária federal de segurança máxima do governo federal foi favorecida por erros que poderiam ter sido evitados e evidenciaram fragilidades no presídio de Mossoró (RN). Transferidos do Acre no ano passado e considerados criminosos de alta periculosidade, Deibson Cabral Nascimento e Rogério da Silva Mendonça tiveram acesso a equipamentos que não deveriam estar disponíveis para cortar o alambrado da unidade. A movimentação a partir das celas onde deveriam estar com a segurança reforçada escapou da vigilância da unidade, provavelmente por falhas nas câmeras nos corredores e pátios do complexo.

Foi por volta das 3h da madrugada de quarta-feira que os dois presos fizeram buracos no teto nas celas em que estavam, para iniciar a fuga. A Polícia Federal apura a vulnerabilidade dos espaços, que não seriam aqueles em que eles permaneciam reclusos habitualmente. Os dois cumpriam o regime disciplinar diferenciado, usado no caso de “subversão da ordem ou disciplina internas”, como prevê a Lei de Execuções Penais, o que pressupõe a necessidade de uma vigilância mais rígida.

Depois de deixaram as celas, os presos passaram por um compartimento onde passa a fiação interna da unidade. Eles chegaram a remover fios, mas uma eventual falha do equipamento não disparou nenhum alarme.

Em seguida, Rogério e Deibson chegaram a um terraço onde é feito o banho de sol. Apesar de ser um espaço aberto, a movimentação não foi flagrada por nenhum agente penitenciário. O presídio de Mossoró conta com 200 câmeras que controlam os espaços comuns, como corredores e pátios, mas esse sistema não funcionou para detê-los nesta etapa. As imagens produzidas são transmitidas não apenas para a segurança da unidade, mas para uma equipe em Brasília da Secretaria Nacional de Políticas Penais do Ministério da Justiça. Também havia problemas de iluminação, com algumas luzes internas apagadas, segundo as informações iniciais da investigação aberta pela Polícia Federal sobre a falha na segurança de Mossoró.

Foi no terraço que os dois teriam conseguido um instrumento fundamental para escaparem: um alicate que era usado nas obras que estavam sendo feitas nesta parte da penitencária. O alicate estava disponível com outros equipamentos empregados no serviço que deveriam estar guardados e protegidos em outro lugar.

A peça foi usada para os presos cortarem a cerca em volta do presídio. O corregedor da penitenciária, Walter Nunes, afirmou que há imagens deste momento, em que ambos estão com o uniforme azul usado pelos internos da unidade. Mas mesmo com o sistema de transmissão duplo para Brasília e para a segurança da própria unidade, não houve alarme.

— Temos imagens. Mas não foi identificado que ali estava uma pessoa fugindo da unidade prisional —afirmou Nunes, em entrevista à GloboNews.

A ausência dos presos nas celas só foi identificada às 5h — ou quase duas horas depois do início da fuga. Foi o tempo necessário para que Deibson e Rogério conseguissem se afastar ao menos sete quilômetros da penitenciária. Eles teriam chegado a uma residência que foi assaltada no Rancho da Caça, na zona rural de Mossoró.

A coincidência entre a fuga e o tempo do arrombamento é o mais forte indício de que Deibson e Rogério passaram pelo local. Da casa, foram levados biscoitos, roupas, pares de tênis, pão de forma, queijo, margarina, uma melancia e fósforos, indicando que os ladrões queriam trocar de vestimenta e estavam se preparando para passar muito tempo em um lugar onde não teriam acesso a outro lugar para se alimentar, ficando, portanto, escondidos.

LISTA VERMELHA DA INTERPOL

As buscas aos dois se concentravam ontem em um raio de 15 quilômetros ao redor da Penitenciária de Mossoró. Mas o Ministério da Justiça informou que o nome de Deibson e Rogério foram incluídos no sistema de difusão vermelha da Interpol. O alerta, que é do grau mais alto do sistema da Interpol, é emitido quando autoridades identificam indivíduos que representam ameaça iminente à sociedade.

A informação foi dada pelo Secretário Nacional de Políticas Penais do Ministério da Justiça, André Garcia, em entrevista ontem em Mossoró. Inicialmente, os dois haviam sido colocados na lista laranja da Interpol. Segundo o secretário, a inclusão não indica que os detentos tenham fugido do Brasil.

—Há sempre essa prevenção e atuação preventiva por parte da Polícia Federal —afirmou Garcia.

Conhecido como “Tatu” ou “Deisinho”, Deibson responde a 34 processos na Justiça do Acre, por crimes como formação de quadrilha, tráfico de drogas e roubo. Documentos da Justiça mostram que Deibson já havia fugido e tentado fugir outras vezes da cadeia e é tido como um criminoso de alta periculosidade.

Rogério é citado em documentos como um “extremamente frio”. Ele exibe uma suástica tatuada numa das mãos. A dupla, que é apontada como integrante da facção criminosa Comando Vermelho, foi transferida para Mossoró em 27 de setembro do ano passado, depois de participar de uma rebelião em um presídio no Acre onde cinco detentos foram mortos. Três deles foram decapitados.

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