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TESTEMUNHA DO FIM DO MUNDO

‘EO’

SUSANA SCHILD

Omundo acabou ou está em vias de. Não se pode dizer que os remanescentes honrem a velha categoria de “humanos”. De contextos diversos, revelam-se violentos, irracionais e indiferentes em relação aos mais frágeis. Sejam pares ou animais. EO que o diga —se pudesse falar. Burrinho inteligente e sensível, até que não era infeliz no politicamente incorreto trabalho em circo na Polônia, onde pelo menos tinha o carinho da adestradora. Abandonado à própria sorte (entendase, azar), o doce animal percorre estradas, campos, pequenas cidades, até chegar à Itália. A paisagem pode ser deslumbrante, adjetivo que não se aplica aos supostos bípedes que cruzam ou atravancam seu caminho e que parecem dominados por um ímpeto incontrolável de violência. Apenas lembranças da antiga “dona” aliviam a solidão de EO.

Festejado em circuitos internacionais, concorrente ao Oscar de filme internacional deste ano, “EO” constitui homenagem de Jerzy Skolimowski ao clássico “A grande testemunha”, de Robert Bresson, dos idos de 1966. Com carreira dividida entre Estados Unidos e Europa, o diretor polonês construiu fábula pessimista em tom de alerta aos descalabros e ameaças em relação aos mais vulneráveis. Para captar a distopia do presente, utilizou uma câmera inquieta, cortes abruptos, flashes que tingem a tela de vermelho, trilha sonora onipresente, raras falas e muitos tipos exóticos (Isabelle Huppert, rosto conhecido, parece saída de um museu de cera). Um consolo: nenhum animal foi maltratado durante as filmagens, e a sobrecarga de EO foi dividida por cinco. Pois é.

Cinema

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2023-06-01T07:00:00.0000000Z

2023-06-01T07:00:00.0000000Z

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