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‘NÃO QUERIA DESCOBRIR A PÓLVORA’

LUIZ FERNANDO VIANNA Especial para O GLOBO

Roberta Sá se lançou para valer em 2005, com o CD “Braseiro”. A primeira faixa parecia declaração de princípios: “Eu sambo mesmo”, de Janet de Almeida. Ela preferia em entrevistas, porém, não se classificar como cantora de samba, mas como “intérprete de música brasileira”.

Agora, na maioridade dos 18 anos de carreira, o lançamento de um trabalho em áudio e vídeo intitulado “Sambasá — Ao vivo” deveria mostrar que aquela insegurança passou. Só que não.

—Não mudou. Está cada vez mais claro para mim que eu estava certa. Não por me rotularem, já que o rótulo de cantora de samba muito me deixa prosa. Mas, como sou do Rio e tinha contato com Monarco, dona Surica, Paulinho da Viola, eu me sentia usurpadora. Acho que sou uma aprendiz de cantora de samba. É uma questão de pudor, de respeito —explica ela, nascida em Natal, mas no Rio desde os 9 anos.

O novo projeto difere de anteriores, em primeiro lugar, pela sonoridade. É instrumentação de samba com músicos que se dedicam quase exclusivamente ao

ROBERTA SÁ LANÇA ÁLBUM AO VIVO DEDICADO AO SAMBA, PARTE EM TURNÊ COM A FILHA E DIZ QUE NÃO BUSCA NOVOS PÚBLICOS: ‘COM 42 ANOS, NÃO É UMA PREOCUPAÇÃO’

samba. E, também, pelas composições. Há músicas de autores do momento, como Wanderley Monteiro, Toninho Geraes, Chico Alves, Fred Camacho, Carlos Caetano e Nego Álvaro. E outras dos repertórios de estrelas como Beth Carvalho, Zeca Pagodinho, Martinho da Vila e Arlindo Cruz.

— Não queria descobrir a pólvora — diz Roberta. — Queria cantar coisas de que eu gostasse, que fizessem parte da minha memória afetiva, que o público soubesse cantar.

A ideia surgiu em 2021. Aliada a seu marido, o produtor Pedro Seiler, ao cavaquinista e diretor musical Alaan Monteiro e ao violonista Gabriel de Aquino, ela foi escolhendo as músicas. No ano passado, lançou o “Sambasá” de estúdio, com cinco inéditas e mais “Sufoco”, em duo com Péricles, e “Pago pra ver”, com Zeca Pagodinho”. O “ao vivo” foi gravado em 24 de setembro no Circo Voador — onde ela se apresentará em 17 de junho.

—Em outros shows e festas populares, eu acabava montando repertórios de sambas da minha carreira e outros. Assumi agora que sempre foi assim. Não me vejo deixando de ser quem sou como artista. Se o samba virar o fio condutor da minha carreira, tudo bem. Na verdade, já era — afirma ela, que vê “Sambasá” como algo que talvez continue com singles e novos álbuns.

‘INTERESSA?’

A cantora já experimentou alguns formatos em seus discos, como o intimista “Quando o canto é reza”, ao lado do Trio Madeira Brasil, e o pop “Segunda pele”. O projeto de agora pode soar como nova busca de um público mais amplo. Ela nega.

— Com 42 anos, não é uma preocupação. Cansei de entender que não traz nenhum resultado que me agrade. Confesso que procurei isso em trabalhos anteriores, como o “Segunda pele”. Gosto do disco, mas não me agradou a sensação dessa busca. Tenho público muito solidificado, que me mantém viva e atuante como artista. Se vier mais gente, pode chegar —diz ela, que canta no “Sambasá ao vivo” peças de resistência de sua carreira como “Alô fevereiro” (Sidney Miller), “Interessa?” (Carvalhinho) e “Samba de um minuto” (Rodrigo Maranhão).

A gravação no palco do Circo aconteceu quando ela estava com seis meses de gravidez. Lina nasceu em 19 de dezembro, mesmo dia do aniversário da mãe.

— Quis fazer esse registro para ela, para que ela possa me ver grávida. Fiquei muito cansada, o diafragma contraído, mas quis fazer para ela e por causa dela — conta Roberta.

Lina embarcará para o exterior já aos 6 meses. Sua mãe fará cinco shows na Europa este mês e em julho, um deles dividindo com Gilberto Gil uma noite do Festival de Montreux, na Suíça. Não haverá babá — Roberta e Seiler decidiram não ter.

—Não vou deixar de trabalhar. Não posso, nem por questões emocionais nem financeiras. A turnê pela Europa será uma aventura. Mas Pedro vai comigo, e eu trabalho com amigos, todos se ajudam —diz.

“Sambasá ao vivo” tem uma participação: Áurea Martins em “Nos braços da batucada” (de Arlindo Cruz, Babi e Jr. Dom).

— Áurea representa as mulheres do samba. É essa cantora que um dia hei de me tornar. Estou estudando há 20 anos para isso — afirma Roberta.

Segundo Caderno

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2023-06-01T07:00:00.0000000Z

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