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Ex-GSI suprimiu avisos da Abin de relatório sobre 8 de janeiro

Alertas passado para o celular do ex-ministro Gonçalves Dias sobre riscos crescentes de tumulto e invasão de prédios públicos em 8 de janeiro foram retirados de documentos oficiais enviados a comissão do Congresso

MALU GASPAR.

Em relatório ao Congresso, general GDias omitiu ter recebido no celular aviso sobre os atos golpistas, revela

Relatórios enviados pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) à Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência (CCAI) do Congresso revelam que o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) de Lula, então comandado pelo general Gonçalves Dias, adulterou um dos documentos, para retirar registros de que o militar foi informado dos riscos dos ataques golpistas de 8 de janeiro.

A alteração, que suprimiu do material mensagens enviadas para o celular dele com alertas sobre os atos que ocorreriam dias depois, deve se tornar o primeiro grande foco de investigação da CPI formada para investigar os ataques aos prédios públicos. A comissão começou a trabalhar na quinta-feira passada e já soma quase 500 pedidos de requerimentos para ouvir autoridades, entre outras solicitações de quebra de sigilo. Gonçalves Dias, conhecido com GDias, é o principal alvo.

A adulteração dos documentos foi percebida ontem durante uma reunião secreta da CCAI da qual também participou a cúpula da Abin, que tomou conhecimento da disparidade. O material, que fora entregue ao ministro do Supremo Alexandre de Moraes e deve ser encaminhado à CPI mista, é composto por dois relatórios, segundo parlamentares que tiveram acesso a eles.

DUAS VERSÕES

Eles constataram que no primeiro documento, entregue à CCAI em 20 de janeiro e assinado por Saulo Moura da Cunha, diretoradjunto de GDias, não constam os 11 alertas que o então ministro recebeu no próprio telefone celular entre 6 e 8 de janeiro sobre a movimentação dos golpistas.

Esses mesmos alertas, contudo, estão em outra versão do mesmo documento, enviada pela mesma Abin à mesma comissão, em 8 de maio, quando o GSI já estava sob o comando do general Marco Antonio Amaro. O oficial assumiu o órgão após a demissão de GDias.

A primeira versão do documento foi enviada ao Congresso por requisição da própria CCAI, logo depois dos atos golpistas. Já a segunda foi entregue por ordem do ministro Alexandre de Moraes, em resposta a um pedido da ProcuradoriaGeral da República.

No último dia 4, Moraes não só determinou que a Abin e a PM do DF fornecessem os relatórios à PGR como também mandou que a comissão do Congresso enviasse todos os relatórios de inteligência que recebeu das autoridades.

Na segunda versão do documento, assinada pelo atual diretor-adjunto da agência, Alessandro Moretti, aparecem 11 envios de alertas ao celular de GDias, incluindo três mensagens enviadas só a ele.

Lidas em sequência, elas não deixam dúvidas de que a percepção dos agentes de inteligência do próprio governo identificaram “risco de ações violentas contra edifícios públicos e autoridades”.

Diz a mensagem enviada em 6 de janeiro, às 19h40m: “Destaca-se a convocação por parte de organizadores de caravanas para o deslocamento de manifestantes com acesso a armas e a intenção manifesta de invadir o Congresso Nacional. Outros edifícios da Esplanada dos Ministérios poderiam ser alvo das ações violentas.”

A mensagem seguinte, do dia 7, informa que 18 ônibus de outros estados chegariam a Brasília no dia 8 para engrossar o acampamento em frente ao Quartel-General do Exército. E acrescenta: “Mantêm-se convocações para ações violentas e tentativas de ocupações de prédios públicos, principalmente na Esplanada dos Ministérios”.

Uma das mensagens que só GDias recebeu foi enviada na manhã do próprio dia 8, alertando que cem ônibus já haviam chegado a Brasília para os atos.

O general Gonçalves Dias pediu demissão depois que a CNN exibiu vídeos gravados pelas câmeras do interior do Palácio do Planalto no momento da invasão. Nas imagens, que antes haviam sido colocadas em sigilo pelo próprio ministro do GSI, ele aparece andando pelo Palácio, interagindo com os invasores, enquanto outros funcionários indicam a saída aos golpistas.

Em depoimento à Polícia Federal, GDias negou ter recebido alertas da Abin sobre os riscos de invasão e ataques aos edifícios-sede dos três Poderes. O general manteve a negativa na semana seguinte, quando o jornal Folha de S.Paulo publicou em primeira mão o conteúdo dos alertas.

INFORMAÇÕES DETALHADAS

As negativas do ministro vinham intrigando os investigadores da Polícia Federal, assim como integrantes da própria Abin. Os servidores da agência conheciam apenas os relatórios originais e não sabiam que o material entregue ao Congresso havia sido adulterado.

A comparação dos dois documentos, feita agora, ajuda a esclarecer por que GDias manteve a versão de que não recebeu nenhum aviso.

O relatório de inteligência foi produzido pela Abin entre os dias 2 e 8 de janeiro e contém uma extensa tabela com três colunas. A primeira indica a data e o horário do envio; a segunda, o conteúdo das mensagens; e na terceira coluna aparecem os nomes e contatos de quem recebeu cada mensagem.

Parlamentares que analisaram as duas versões do documento na sala-cofre da CCAI afirmam que a diferença as duas versões é muito evidente. Mas não é possível saber ou inferir, apenas pela observação, quem no GSI suprimiu as informações e como isso foi feito.

Procurados pelo GLOBO, tanto a defesa do exministro, como o diretoradjunto da Abin, Alessandro Moretti, e Saulo Moura da Cunha, não retornaram o contato.

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2023-06-01T07:00:00.0000000Z

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