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Terceira via tem oportunidade diante de si

Maioria está descontente com dois extremos políticos, mas até agora ninguém soube aproveitar a chance

Aerosão do centro político desafia diversos países. Alimentada por sucessivas crises econômicas nas primeiras décadas deste século e pelo crescimento das redes sociais, a polarização entre esquerda e direita, amigos e inimigos, nós e eles se tornou o ingrediente decisivo em eleições mundo afora. Em muitas sociedades, na brasileira inclusive, a divisão em dois campos políticos opostos cresceu a ponto de a identidade social ser suplantada pela identidade política. Até pais e mães passaram a avaliar futuros genros ou noras pelo apoio a este ou àquele candidato.

Traz certo alento, diante desse quadro, a pesquisa Ipec noticiada pelo GLOBO. Dos entrevistados, 57% afirmaram concordar total ou parcialmente com a afirmação: “gostaria que o Brasil tivesse uma terceira via para evitar a polarização política no país”. Apenas 18% declararam discordar totalmente e 9% em parte. A opinião majoritária no Brasil, portanto, é que a divisão entre petistas e bolsonaristas que deu o tom nas duas últimas eleições presidenciais tem feito mais mal que bem ao país. É uma boa notícia. Despolarizar é mesmo necessário.

Ao mesmo tempo, o resultado não é surpreendente. A eleição do ano passado deixou claro que os votos dos petistas não teriam bastado para eleger o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Foram os eleitores mais ao centro do espectro ideológico que garantiram sua vitória, e eles têm motivos para desejar uma terceira via. Da mesma forma, os votos da extrema direita bolsonarista não bastaram para eleger Jair Bolsonaro em 2018. Ele também dependeu de votos do centro, sobretudo da parcela antipetista.

Por isso mesmo, é preciso ter cautela ao interpretar o resultado apontado pelo Ipec. Uma coisa é o que o brasileiro diz na pesquisa, outra o que decide na hora do voto. A existência de uma porção majoritária da sociedade insatisfeita com os extremos não é propriamente nova. Nas urnas, contudo, grande parte desses eleitores tem acabado por escolher um dos polos, na tentativa de dar a vitória ao “menos pior”. É essa a lógica fundamental da polarização, insuflada tanto por Lula quanto por Bolsonaro. É uma armadilha difícil de desarmar.

A principal deficiência do campo político identificado com o centro é a carência de nomes populares. Diversas candidaturas que tentaram emergir nessa raia naufragaram, incapazes de despertar uma fração da paixão e da popularidade associadas a líderes como Lula ou Bolsonaro. Sem isso, o desejo de uma terceira via não tem como se tornar realidade — afinal não aparecem as palavras “terceira via” em nenhuma urna eletrônica, apenas nomes de candidatos.

É certo que o Brasil já viveu épocas de polarização acirrada, seguidas de períodos de menor tensão política —os governos Collor e Itamar são exemplos. Não há polarização que dure para sempre. A pesquisa Ipec serve, mais uma vez, para reiterar que está aberta uma oportunidade. O brasileiro espera que surja alguém com capacidade e talento político para saber aproveitá-la.

Opinião Do Globo

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2023-03-21T07:00:00.0000000Z

2023-03-21T07:00:00.0000000Z

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