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‘FIZEMOS MAIS DO QUE ERA ESPERADO NA PANDEMIA’

Mario Moreira / PRESIDENTE DA FIOCRUZ Interino exalta atuação da fundação diante da Covid e revela planejamento para produzir e coordenar terapias avançadas

EVELIN AZEVEDO evelin.machado@infoglobo.com.br

AFiocruz já conversa com o Ministério da Saúde para produzir e coordenar o desenvolvimento de terapias avançadas no Brasil, afirma Mario Moreira, presidente em exercício da fundação. Esses tipos de tratamentos são aqueles que incluem produtos de terapia gênica e tecidos artificiais para uso em humanos, normalmente indicados para doenças praticamente incuráveis.

Moreira, até então diretor-executivo da Fiocruz, assumiu a presidência da instituição após Nísia Trindade aceitar o convite para o Ministério da Saúde. Na instituição desde 1994, Moreira é doutor em políticas públicas pela Universidade Federal do Paraná. Seu mandato vai até 2 de abril.

Em sua avaliação, a Fiocruz entregou mais do que o esperado durante a pandemia de Covid-19, desenvolveu conhecimentos e protocolos que ajudarão diante de uma possível nova crise sanitária e ainda tem muito a apresentar ao povo brasileiro nos próximos anos.

Qual é a avaliação do senhor sobre o papel da Fiocruz durante a pandemia?

Colocamos todo nosso ativo científico e tecnológico a favor do enfrentamento do coronavírus. Na minha visão, fizemos mais do que era esperado durante a pandemia. A Fiocruz se engajou na produção de informações epidemiológicas para que os tomadores de decisão nas esferas federal, estadual e municipal pudessem se organizar no combate à pandemia. Além do Info Gripe e do Observatório Covid, produzimos informações epidemiológicas sobre a utilização e a eficiência das vacinas, assim como acompanhamento importante da ocupação hospitalar, do número de casos e do número de mortes.

Desenvolvemos dois tipos de testes moleculares para a Covid, que foi o mais usa dono Brasil. A Fiocruz chegou a entregar ao Ministério da Saúde cerca de 18 milhões de reações para diagnóstico molecular da Covid. Mas não paramos por aí. O que talvez tenha tido mais destaque foi a nossa ação nocam poda vacina, nosso acor dopara nacionalizara tecnologia do imunizante desenvolvido pela Universidade de Oxford, cujos direitos de comercialização pertencem à empresa Astrazeneca.

O que a Fiocruz aprendeu com esse processo de nacionalização da vacina contra a Covid?

Em seis meses nós conseguimos adaptar a planta da nossa fábrica para que ela pudesse reproduzir a vacina da Universidade de Oxford. Essa planta está à disposição para a produção de outros produtos para saúde. Ela é rapidamente adaptável, porque aprendemos a lidar, sobretudo, com produtos que são derivados de vetores virais. Mas também nela temos capacidade e algum acúmulo de aprendizado para desenvolver outros tipos de imunizante. Na verdade, já estamos desenvolvendo uma vacina baseada na tecnologia de RNA mensageiro. Tivemos um grande aprendizado no campo da engenharia de como adaptar rapidamente as nossas instalações industriais — evidentemente atendendo às especificações da Anvisa — para situações dessa natureza em que não há vacina pronta ou um outro produto. Conseguimos estabelecer procedimentos que possam rapidamente dar maior flexibilidade a nossa instalação de produção. E agora a nossa expectativa é que ainda este ano sejam iniciados os estudos clínicos da nova vacina. Essa é uma fase fundamental para que se comprove a eficácia e, sobretudo, a segurança da vacina. Em breve, nós vamos apresentar esse projeto para a Anvisa para que possamos fazer isso da mesma maneira que foram desenvolvidas e registradas outras vacinas para Covid.

A Fiocruz pode ser beneficiada por ter sua ex-presidente, Nísia Trindade, como atual ministra da Saúde, no sentido de ela conhecer profundamente as necessidades da instituição?

Há uma oportunidade de direção dupla. Evidentemente, a experiência da Dra. Nísia na Fiocruz a dá credenciais para conduzir o Ministério da Saúde com uma percepção muito clara de quais são as prioridades, sobretudo, destacando a sua capacidade de escuta e de articulação com diversos setores da sociedade. Ela conhece o Sistema Único de Saúde — esteve na Fiocruz desde a década de 1980. Ela tem ciência do que pode extrair da Fiocruz, mas, ao mesmo tempo, a Fiocruz tem plena ciência e responsabilidade também em colocar a favor do ministério todo seu ativo científico e tecnológico. Acho que essa é uma relação recursiva. Será, portanto, uma relação muito positiva com o governo federal e, evidentemente, com muitos desafios pela frente.

Já houve alguma conversa com o novo governo?

Falamos sobre as chamadas terapias avançadas. É algo que está se desenvolvendo muito rapidamente e com um nível de eficiência importante, que estão possibilitando a cura de doenças até então incuráveis. No entanto, essas terapias avançadas apresentam, por suas características, um custo elevadíssimo para o Ministério da Saúde. Para se ter ideia, uma das últimas drogas lançadas destinada à terapia de hemofilia tipo B custa 6 milhões de dólares por paciente. No Brasil temos cerca de 20 mil pessoas acometidas por essa doença. O nosso sistema de saúde é universal, ou seja, direito de todos e dever do Estado. Portanto, é preciso lidar com esses desafios tecnológicos e que impõem uma pressão absurda sobre o orçamento do governo. Se não houver o desenvolvimento de uma capacidade tecnológica nacional do setor público, principalmente, mas também do setor privado, isso vai gerar uma situação que coloca em risco a sustentabilidade do sistema. Já há uma prática de judicialização no Brasil por meio da qual as pessoas têm conseguido acesso a essas terapias mesmo elas não sendo produzidas aqui. A Fiocruz vai entrar com empenho e prioridade nesse processo de desenvolver, na própria instituição, e articular uma rede tecnológica e produtiva para que o Brasil ao menos reduza essa dependência de importados e com isso diminua drasticamente o custo dessas terapias para o SUS.

“Já estamos desenvolvendo uma vacina baseada na tecnologia de mRNA”

“A Fiocruz vai entrar com empenho e prioridade nesse processo de desenvolver e coordenar a produção das terapias avançadas no Brasil”

Saúde

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2023-01-27T08:00:00.0000000Z

2023-01-27T08:00:00.0000000Z

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