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Cristina Kirchner se diz vítima de ‘pelotão de fuzilamento’

Acusada de corrupção, Cristina se diz perseguida em final de julgamento

JANAÍNA FIGUEIREDO janaina.figueiredo@oglobo.com.br BUENOS AIRES

Vice-presidente argentina foi ouvida ontem na última fase do julgamento em que é acusada de corrupção. Sentença será conhecida em 6 de dezembro.

Na fase judicial chamada na Argentina de “alegações finais”, a vice-presidente Cristina Kirchner, acusada pelo Ministério Público de associação ilícita e fraude contra o Estado nas Presidências dela e do marido, N és torKirchner, disse ontem ser vítima de um“pelotão de fuzilamento ”, que buscou estigmatizá-laco mo dirigente política eaokirchner ismo como movimento. Logo depois do pronunciamento, a sentença do caso foi marcada para 6 de dezembro.

— Em dezembro de 2019, eu disse que este era o tribunal do lawfare [batalha judicial com motivação política], mas hoje considero que é um pelotão de fuzilamento—disse a vice-presidente, queécot ad apara disputara Presidência em 2023, afirmando, ainda, que“a História vai condenar” os seus acusadores.

PRISÃO E INABILITAÇÃO

Num discurso breve, Cristina acusou os promotores Diego Luciani e Sergio Morla de terem mentido, inventado fatos e escondido informações ao longo do processo. Em setembro, ambos pediram 12 anos de prisão e a inabilitação política perpétua de Cristina, acusando-ade responsabilidade, como coautora, dos crimes de associação ilícita, agravada por sua condição de chefe, e fraude contra o Estado. De acordo com o Código Penal argentino, a condenação máxima em caso de associação ilícita é de 12 anos, e de fraude ao Estado, de 6, além da proibição de ocupar cargos públicos.

— Os promotores atuaram como se fossem os que escrevem os editoriais dos jornais Clarín e La Nación. As opiniões são livres, mas os fatos são sagrados — frisou a vice-presidente, que também preside o Senado, em declaração feita do seu gabinete na Casa.

Cristina relacionou o processo judicial, um dos tantos que enfrenta, coma tentativa de assassina toque sofreu em1º de setembro.

—Tentaram me matar, mas o tiro não saiu... A mulher que acompanhava apessoa que quis me matar [ o brasileiro residente na Argentina Fernando Sabag Montiel] seguia os promotores nas redes sociais Facebook e Twitter. Dirão que sou exagerada, mas... — disse a vice-presidente.

Durante o processo, os promotores afirmaram considerar suficientes as provas conseguidas para sustentar que Cristina foi chefe de uma associação ilícita que, em seu governo (2007-2015) enode seu marido e antecessor, Néstor

Kirchner (2003-2007), favoreceu o empresário— e sócioda antiga famíliap residencial—Lázaro Báez em concessões de obras públicas.

O julgamento começou em 2019 e nele são investigadas supostas irregularidades em 51 obras públicas nas quais a empresa que Báez fundou após a eleição de Kirchner, a Austral Construções, teriam sido favorecidas. Muitas das obras, disseram os promotores, não foram concluídas e em muitos casos, acrescentaram, foram superfaturadas.

Em um de seus pronunciamentos, o promotor Luciani disse uma frase que marcou o processo: “Néstor Kirchner, e posteriormente sua mulher, Cristina Fernández, instalaram e mantiveram no coração da administração pública nacional uma das matrizes de corrupção mais extraordinárias já desenvolvidas no país”.

Em meio a especulações sobre sua possível candidatura à Presidência nas eleições de outubro de 2023, Cristina insiste na tese da perseguição política:

— Meu governo entregou um país sem dívidas. Os que trouxeram o Fundo Monetário Internacional de volta e uma dívida de US$ 45 bilhões não têm problema algum, estão vendo a Copa do Mundo no Catar — afirmou, em referência ao ex-presidente Mauricio Macri (2015- 2019).

Entre kirchneristas e peronistas, as comparações com o presidente eleito do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, são permanentes. Mas uma eventual prisão de Cristina ainda parece pouco provável, embora não impossível. A vice-presidenteargentina tem foro privilegiado e não poderia ser detida, amenos que a Justiça a flagre cometendo um crime ou com autorização do Congresso. Em fevereiro de 2023, Cristina fará 70 anos e, a partir desse momento, poderá, se for o caso, solicitar o benefício da prisão domiciliar.

Uma eventual inabilitação também dificilmente a impediria de concorrer, já que ela pode recorrer até à Corte Suprema argentina e a sentença só passa a valer após a confirmação em última instância.

— O partido judicial substituiu o partido militar, e hoje limita a expressão na democracia, estigmatiza e disciplina os dirigentes argentinos — concluiu a vice-presidente, que hoje aparece nas pesquisas combo as chances de venceras eleições primárias da coalizão governista Frente de Todos.

Agrande incógnita no paí sés e Cristina decidirá, finalmente, ser ou não candidata. A vitória de L ulano Brasil animou seus seguidores. Para analistas como Carlos Fara, diretor da Fara e Associados, “as chances de que Cristina seja candidata aumentarão” se Macri também decidir concorrer.

—Cristina vai tentar um novo mandato se tiver certeza que ganha e se Ma cri for seu rival—enfatiza Fara, confirmando que“esteéap enas o julgamento de primeira instância, e nada acontecerá com Cristina enquanto não houver uma condenação firme”.

PROCESSO MAIS AVANÇADO

Na visão do ex-senador Federico Pinero, um dos veteranos da aliança opositora Juntos pela Mudança, “apenas 25% dos argentinos acreditarão em Cristina”.

—A vice-presidente não se dirigiu aos juízes, mas, sim, a seus seguidores mais fanáticos. Muito do que ela diz contradiz frontalmente fatos da realidade —afirma Pinedo.

A advogada Silvina Martínez, que apresentou algumas denúncias contra Cristina e seus filhos, Máximo e Florencia, nos tribunais de Buenos Aires, acredita que a condenação poderia ser, finalmente, de oito anos de prisão.

— Ela será condenada. Acredito que oito anos poderia ser uma sentença possível —especulou a advogada.

Esteéo processo judicial mais avançado contra a vicepresidente. Em outros casos, Cristina foi absolvida, houve apelações e os tribunais continuam analisando as denúncias. Enquanto não houver uma condenação firme, a vice presidente pode ser candidata e assumir cargos públicos.

— Da maneira como funciona o Judiciário argentino, as chances de que Cristina, de fato, termine presa, são baixas — concluiu o jornalista Adrián Ventura, do canal de TV Todo Notícias.

Inabilitação só tiraria Cristina de futura disputa presidencial após última instância

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2022-11-30T08:00:00.0000000Z

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