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Mulher negra, ESG e a presença em conselhos

RACHEL MAIA oglobo.com.br/economia economia@oglobo.com.br

Omês é novembro, e o mundo tem seus olhos voltados para as discussões relacionadas às mudanças climáticas. A 27ª Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU), a COP27, foi realizada no Egito, até o último dia 18. O território de realização, África, nos coloca no centro de nossas reflexões sobre a mulher negra, o ESG e a presença feminina em conselhos.

No passado, na África, berço meridional da humanidade (Diop, 1989), a vida ligada à agricultura fez com que a mulher fosse a base de uma função central, os cuidados com a terra. Era ela quem trabalhava na formação de uma sociedade agrária. Portanto, a evidência de uma sociedade matriarcal se deu naquele lugar. O poder da mulher estava baseado em seu papel econômico.

A mãe possuía um sacro poder, e sua autoridade era ilimitada. (Oliveira, 2018). “Hoje, quando referenciamos a ancestralidade, a mulher é sinônimo de cuidado, saberes, prosperidade e guardiãs do legado da família, de um povo, de uma nação”, conta Samanta Lopes.

Ao lermos esse passado, observamos e aprendemos que as mulheres negras têm um conhecimento ancestral ligado à forma de lidar, por exemplo, com o partilhar. “Que mulher não trocou um material por outro?”, explica Soraia B. Cardoso. Hoje o sentido da troca ganha uma nova roupagem e passa a se chamar “economia colaborativa”. Há modos de fazer intrínsecos a nossa realidade histórica sendo revisitados, como novos modelos de mudança para a sociedade atual, e não estamos sendo chamadas para nos sentar à mesa de discussão, ainda que tenhamos habilidades para tal.

“Nós somos sustentáveis na essência, algumas vezes como resultado da escassez produzida pelo racismo, que nos tira o direito aos bens econômicos; outras, como memória do fazer multiplicar no coletivo”, destaca Soraia. O esforço do Coletivo Pacto das Pretas, projeto realizado pela Associação Pacto de Promoção da Equidade Racial, é para que estejamos presentes nas colaborações para mudanças, pois a diversidade garante a sustentabilidade e a equidade.

“A redução das disparidades se constitui ao dar visibilidade a um olhar interseccional, que abarque a diversidade de gênero, raça, classe social e orientação sexuale considere o investimento em mulheres negras como um potencial transformador social ”, indica Andrei aSimp li cio. Porém, apressão recente por inclusão de regras que garantam métricas de maior transparência nas instâncias regidas pelo Environmental (E), Social (S) e Governance (G) ainda não abrange marcadores sociais como as questões de raça e classe social.

Hoje, as populações racializadas são minorizadas em todas as letras da sigla. Um descompasso entre a enorme capacidade de transformação que estamos aptas a contribuir e a realidade dentro das instituições. No “E” de meio ambiente, são as populações mais prejudicadas pelos impactos ambientais, que sofrem maior desigualdade em termos de território atravessado pelo racismo ambiental. Na parte social, o “S”, historicamente tiveram seus acessos barrados. E no “G”, ou seja, na governança, fica evidente a sub-representação dentro dos conselhos das empresas, elucida Débora Montibeler.

Olhar para as diretrizes ESG no campo mais amplo da sustentabilidade é condicionante ao bem viver. Sendo assim, racializar o ESG tem sido urgente e fundamental para a discussão sobre equidade. Estamos no novembro negro e destacamos o protagonismo das mulheres na sociedade matriarcal, lembrando que do Egito à realidade atual a mulher negra pode e deve estar presente nos espaços de tomada de decisão, e os conselhos se tornam uma realidade que diz sobre a capacidade histórica de visão e percepção de mundo. “É essencial que estejamos presentes! Visamos das bases aos conselhos, e as diretrizes ESG são fundamentais para estes objetivos. Mobilizações atuais para a aceleração e a troca de conhecimentos são caminhos importantes e urgentes a serem ocupados e percorridos”, enfatiza Karla Danitza.

Em alusão à história que começamos, com mulheres atuantes e propositivas na sociedade ancestral, “vemos no papel das conselheiras um lugar de contribuição para novos olhares, novas provocações e reflexões, para que assim possamos garantir outros caminhos para as bases e as lideranças. Incluir e integrar em diversidade são oportunidades para construirmos uma sociedade mais sustentável”, afirma Adriana Alves.

“E às mulheres negras que conquistam esta representatividade requer movimentar a estrutura, contribuindo assim para que outras lideranças negras acessem os conselhos, a fim de torná-los equânimes”, conclui Luciane Xavier.

Fica no nosso convite para que mais mulheres negras observem os conselhos como possibilidade e que portas sejam abertas.

Este texto é uma produção colaborativa do Coletivo Pacto das Pretas, uma iniciativa do Pacto de Promoção da Equidade Racial, que reúne mulheres negras em prol das discussões de pautas interseccionadas de raça e gênero. Este grupo escreve mensalmente, a convite da Rachel Maia, que abre espaço nesta coluna para a materialização da voz negra coletiva.

Economia

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2022-11-30T08:00:00.0000000Z

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