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Remédio considerado promissor já está em análise pela Anvisa

Brasil avalia nova droga contra insônia tida como promissora por Oxford

BERNARDO YONESHIGUE bernardo.yoneshigue@oglobo.com.br

Motivo de preocupação para 73 milhões de brasileiros, segundo a Associação Brasileira do Sono (ABS), a insônia conta com algumas abordagens médicas, inclusive medicamentosas. Mas muitos remédios disponíveis hoje trazem efeitos colaterais graves, como dependência ou até a piora do sono a longo prazo. Para tirar a dúvida, um time de pesquisadores da Universidade de Oxford resolveu analisar as melhores alternativas no mercado. Chegou a um fármaco tido como promissor: o lemborexant.

Vendido com o nome comercial de Dayvigo nos Estados Unidos, onde foi aprovado pela Food and Drug Administration (FDA), agência reguladora de medicamentos, o remédio foi apontado pelos pesquisadores com tendo o melhor perfil de eficácia, aceitabilidade e tolerabilidade. A conclusão veio após uma ampla revisão de estudos sobre 36 fármacos realizados ao longo de mais de quatro décadas. O trabalho foi publicado na revista científica The Lancet.

“Deve-se notar que o lemborexant age através de uma via diferente no cérebro, o sistema neurotransmissor orexina (hipocretina), um mecanismo novo de ação. O direcionamento mais seletivo dessa via e dos receptores de orexina pode levar a melhores tratamentos farmacológicos para a insônia”, afirma o professor de psicofarmacologia da Universidade de Oxford e co-autor do estudo, Philip Cowen, em comunicado.

O remédio, que representa uma nova alternativa para pessoas que sofrem com o transtorno, está perto de chegar ao Brasil. Procurada pelo GLOBO, a fabricante do lemborexant, a japonesa Eisai, afirmou que o medicamento já está em análise pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária do Brasil (Anvisa) desde 2021, e pode chegar às drogarias já no ano que vem.

— A revisão dos dados está demorando mais do que o previsto devido à pandemia e à prioridade da agência na revisão e aprovação das vacinas e medicamentos destinados à Covid-19. Gostaríamos que a aprovação fosse mais rápida, no entanto compreendemos a situação da Anvisa — afirma o farmacêutico-responsável e diretor de garantia de qualidade da filial brasileira da Eisai, Luiz Silva.

Os antagonistas da hipocretina, como são classificados os novos medicamentos, atuam por meio de um sistema no cérebro diferente dos remédios tradicionais, explica a neurologista Rosana Alves, especialista do sono do Grupo Fleury.

— A hipocretina é um neurotransmissor cujo papel principal é manter a vigília e o despertar. Então, o bloqueio dele consegue aumentar e induzir o sono. Vamos observar melhor nos próximos anos como o remédio vai funcionar, mas os efeitos são promissores — diz a especialista, que é membro da Associação Brasileira do Sono (ABS).

Para a neurologista Dalva Poyares, professora de medicina do sono na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a chegada da alternativa ao mercado é bem-vinda, uma vez que é grande o número de pessoas que sofrem com a doença no país.

— Nós temos que ampliar as nossas opções. A insônia é muito prevalente na população, então quanto mais opções de medicamentos seguros, melhor. E a nova geração é de fato dos antagonistas da hipocretina, que estão evoluindo cada vez mais. Tenho atualmente dez pacientes nos Estados Unidos usando o remédio, e os relatos são de boa tolerância, pouco efeito residual pela manhã. Parece de fato ser uma ótima opção para tratar a insônia a médio prazo —conta Poyares.

SEM MILAGRE

Alves afirma que a chegada do lemborexant, embora animadora, não deve ser vista como solução mágica:

— Toda vez que temos um novo medicamento, precisamos tomar cuidado para não parecer que ele é milagroso. Na maioria dos casos de insônia, é necessário identificar as causas e evitar o uso de remédios de forma prolongada. Essa classe nova de remédios parece promissora, mas precisamos aguardar algum tempo.

Essa nova família de medicamentos seria uma das alternativas para substituir o tipo mais utilizado hoje no Brasil, os benzodiazepínicos. Poyares explica que eles agem de forma contrária aos antagonistas de hipocretina. Em vez de inibir a vigília, eles induzem um neurotransmissor chamado GABA, que promove uma redução da atividade no sistema nervoso e consequente efeito hipnótico. Desde que foram descobertos, na década de 60, viraram sucesso de vendas, sendo utilizados também para tratamento da ansiedade.

— Porém, os benzodiazepínicos causam dependência e a longo prazo favorecem o déficit cognitivo. Então ele é perigoso, ainda mais em quantidades excessivas —alerta a médica.

A partir dos anos 1980, quando esses efeitos negativos começaram a ser relatados, começou um movimento de “desprescrição” dos remédios, para reduzir o número de pessoas dependentes. No entanto, o uso dos fármacos ainda é maior que o recomendado.

Parte desses esforços foram intensificados com a chegada das drogas Z, medicamentos que também atuam no GABA, porém são mais específicos por serem direcionados a apenas uma subunidade do neurotransmissor. O perfil de fato é mais favorável — a revisão de Oxford apontou um deles, a ezopiclona, como uma das opções com os melhores resultados após o lemborexant. Porém, a longo prazo, também podem provocar quadros de dependência.

Rosana Alves, da ABS, reforça que o tratamento da insônia é sempre priorizado com medidas não farmacológicas. Os medicamentos são eficazes e importantes, porém não devem ser a primeira alternativa, e só podem ser ingeridos mediante orientação de especialistas.

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2022-08-12T07:00:00.0000000Z

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