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Inflação da Argentina atinge 7,4% em julho e supera a Venezuela

Em 12 meses, alta de preços chega a 71%, a sétima maior do mundo. Banco Central do país eleva taxa básica de juros para 69,5% ao ano

JANAÍNA FIGUEIREDO janaina.figueiredo@oglobo.com.br BUENOS AIRES

Quando assumiu o comando da pasta econômica, no fim de julho, o novo superministro argentino, Sergio Massa, antecipou que, em matéria de inflação, os próximos meses seriam difíceis. O que Massa não avisou foi que em julho, mês em que a Argentina teve dois ministros da Economia, o Índice de Preços ao Consumidor (IPC) do país superaria até mesmo o da Venezuela de Nicolás Maduro.

De acordo com dados divulgados ontem pelo Instituto Nacional de Estatísticas e Censo (Indec, o IBGE argentino), em julho o IPC teve variação positiva de 7,4%, a maior desde abril de 2002, quando ficou em 10,4%. Até agora, o índice mais alto deste ano havia sido os 6,7% de março.

No acumulado do ano, a inflação chega a 46,2% e, nos últimos 12 meses, a 71%.

Os números, segundo informação da consultoria independente Observatório Venezuelano de Finanças (OVF), superam o da Venezuela no mesmo mês, que ficou em 5,3% — uma forte desaceleração frente a junho, quando atingiu 14,5%.

Nos primeiros sete meses de 2022, a inflação acumulada da Venezuela, sempre de acordo com o OVF, foi de 62%, e o índice de julho foi o quarto mais baixo do ano. Depois de cinco anos de hiperinflação, o governo Maduro conseguiu uma redução do aumento de preços a partir do fim do ano passado, em grande medida, porque, na prática, a economia foi dolarizada.

POBREZA SOBE A QUASE 40%

A situação da Argentina é extremamente delicada, e economistas locais já estimam que o país poderia terminar o ano com uma taxa de inflação de três dígitos. Em junho, a inflação aumentou 5,3%, e o acumulado dos 12 meses foi de 64%.

Com estes dados, a Argentina já ocupa o sétimo lugar no ranking mundial de taxas de inflação, atrás de Líbano (211%), Sudão (199%), Venezuela (170%), Síria (139%), Zimbábue (131%) e Turquia (78%), de acordo com informações do site Infobae.

Consultorias de prestígio no país, como a Fundação de Pesquisas Econômicas Latino-americanas (Fiel), estimam que a Argentina poderia encerrar o ano com inflação de 112,4%. Outras projeções oscilam entre 90% e 95%.

Em seu último relatório, publicado na primeira semana de agosto, o Banco Central da República Argentina (BCRA), com base em projeções de economistas privados, estima IPC de 90% este ano, bem acima dos 76% calculados um mês antes.

Também ontem, pouco antes da divulgação do IPC, o BC argentino elevou sua taxa básica de juros, a Leliq, em 9,5 pontos percentuais, de 60% para 69,5% ao ano. É a maior alta desde 2019. Na semana passada a taxa já havia subido de 52% para 60%, ou seja, em apenas 15 dias houve um aumento de 17,5 pontos percentuais.

O clima no país é de tensão e preocupação pela escalada de preços nos próximos meses. Na noite de quarta-feira, movimentos sociais acamparam em frente à Casa Rosada para pedir melhores salários e auxílio do governo, num momento em que a fome ronda muitas famílias argentinas.

O número de pessoas em situação de insegurança alimentar cresce a cada mês, e as ruas de Buenos Aires são um reflexo do processo acelerado de empobrecimento da população.

Em meio às disputas políticas dentro do governo de Alberto Fernández e até na oposição — esta semana, a agenda política foi dominada pela guerra na coalizão Juntos pela Mudança, integrada pelo ex-presidente Mauricio Macri —, a taxa de pobreza se aproxima de 40%.

—Enquanto nós brigamos, os argentinos estão passando fome. O kirchnerismo está rindo da oposição, e o país ficando cada dia mais pobre — desabafou o senador Luis Juez, um veterano da política argentina, em entrevista a um canal de TV local.

DADO PREOCUPA GOVERNO

Já a Casa Rosada opta por um discurso desconectado da realidade, na tentativa de acalmar os ânimos e transmitir confiança em um governo que, para muitos, tem em Massa sua última chance de dar certo.

— Existe uma sensação de estabilização em relação a muitos temas — afirmou ontem a porta-voz do governo, Gabriela Cerruti.

Ela destacou o aumento no valor das ações de empresas locais e bônus argentinos nas últimas duas semanas, e a vitória do governo em enfrentar o que chamou de “uma tentativa de corrida cambial”. Perguntada sobre a inflação de julho, porém, Gabriela não escondeu a preocupação:

—Claro que não é o número que achamos que devamos ter. Essa é uma das prioridades do governo. Quando estão em jogo movimentos especulativos, está em jogo a mesa dos argentinos —afirmou a porta-voz.

Dados recentes do Unicef Argentina indicam que mais de um milhão de crianças não satisfaz suas necessidades básicas de alimentação; cerca de 20% dos argentinos foram obrigados a se endividar para cobrir despesas diárias; e quase 20% suspenderam a compra de medicamentos.

ECONOMIA

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2022-08-12T07:00:00.0000000Z

2022-08-12T07:00:00.0000000Z

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