Infoglobo

‘ESPERAVA UM GOVERNO LIBERAL E FOI UMA DECEPÇÃO’

Jayme Garfinkel / ACIONISTA CONTROLADOR DA PORTO SEGURO Signatário da Carta pela Democracia, ele se diz arrependido de ter votado em Bolsonaro no segundo turno da última eleição e assustado com falas ‘antidemocráticas e ameaçadoras’ do presidente

MARIANA BARBOSA mariana.barbosa@sp.oglobo.com.br SÃO PAULO Este texto foi originalmente publicado na coluna de negócios Capital, no site do GLOBO: blogs.oglobo.globo.com/capital

Acionista controlador da seguradora Porto Seguro, Jayme Garfinkel se arrependeu de ter votado no presidente Jair Bolsonaro no segundo turno das últimas eleições. Hoje assustado com as “falas antidemocráticas e ameaçadoras” do ocupante do Palácio do Planalto, eleéumd os signatários da Carta pela Democracia, lida ontem na Faculdade de Direito da USP.

O que o levou a se engajar no manifesto pela Democracia do 11 de Agosto?

Eu, como todos, estou muito apreensivo com essas falas assustadoramente antidemocráticas e ameaçadoras. E isso já faz tempo. Temos que fazer uma manifestação vigorosa, que seja sensível, para o pessoal pensar melhor no que vai fazer. Esse movimento poderia ter sido feito há mais tempo, pois as ameaças não são de agora. Mas a sociedade civil é lenta.

Bolsonaro chamou os signatários de mau caráter. Chamou a carta de “cartinha” e disse que o movimento é uma reação ao Pix, que tirou receita dos bancos. Como vê a reação do presidente?

Ele tem capacidade de comunicação impressionante. Ele provoca a reação e depois se diz vítima da reação que provocou. É um fenômeno. De fato, o que ele fala, desde o começo do governo, é sempre discutível. E todo mundo se frustrou. É uma perda de tempo. Uma geração desperdiçada. Não foi só a pandemia, mas a falta de oportunidades. Imagina o que poderíamos fazer se tivéssemos um país mais estável, com equilíbrio e bom senso. O fundamental é que precisamos construir um modelo de confiança. Por isso sempre fui favorável a uma terceira via, temos que fugir dos polos e rumar para uma convergência. Faço parte de outro movimento chamado Convergência, que é para pensar o que é melhor para o país, sem puxar sardinha para um lado ou outro. Temos que pensar no Brasil.

O senhor vê risco real de ruptura?

Acho que há risco. Tem gente que diz que as instituições são fortes, mas por outro lado ninguém sabe o que pensam os militares. Tenho amigos e parentes bolsonaristas que todo dia me bombardeiam com mensagens. A quantidade de

fake news é inacreditável. Outro dia recebi uma capa da Veja que fiquei pensando se era verdadeira e depois vi que só podia ser falsa: o( ministro do Supremo Luís Roberto) Barroso coma suástica nos olhos. Um negócio horroroso. É um perigo danado o que pode acontecer com esse tipo de gente, com esse tipo de cabeça.

Temos visto um engajamento grande do empresariado nestas eleições. O que mudou?

No passado, quando presidia a Porto Seguro, eu não me atrevia tanto. Hoje sou ex-presidente de conselho, apenas acionista, e portanto me sinto mais liberto. A empresa corre risco, tem a opinião do cliente e pode ter, na pior hipótese, retaliação do poder em vigor. Compreendo o medo do empresariado. Mas é bonito conseguir passar por cima dos medos quando a gente está defendendo a democracia, uma estrutura institucional estável. Nesse aspecto, apesar da crise, acho que o Brasil está evoluindo. Até pouco tempo, muita gente nem sabia que existia o STF. Hoje as pessoas sabem a composição toda do Supremo. Bom ver a sociedade discutir a estrutura de poder. Sinal de amadurecimento. As pessoas estão se engajando e percebendo que as estruturas têm que ser preservadas, que é melhor tê-las do que não tê-las.

Qual a sua avaliação do governo?

Agente esperava que seria um governo liberal. Havia uma imagem, muito baseada na figura do Paulo Guedes, de que seria um governo nessa linha. Eu não o conhecia porque não sou do mercado financeiro. Mas tinha referências. E agora ouvi uma frase de outro empresário que achei pertinente. Esse governo é iliberal. Não conseguimos avançar em questões que não são ideológicas, mas lógicas. Precisávamos da reforma da Previdência, de uma estrutura mais moderna das relações de trabalho, reduzir a burocracia. A gente imaginava que ia ter uma melhora de ambiente.

O senhor votou no Bolsonaro na última eleição?

Votei no segundo turno. Não foi nada do que eu esperava, no sentido da pauta liberal. É uma decepção. Deveria ter me informado melhor sobre o que eu estava fazendo. Acho que Bolsonaro demonstrou, no absurdo de algumas ou muitas das coisas que ele disse, coerência. Agente não acredita vaque e rapara valer, e era. Essa coerênciaéaforç adele. Agora, se nós queremos um país democrático e saudável, cheio de confiança, temos que persistir nisso. Sou pela terceiravia. Não importa o resultado da campanha da Simone Tebet,masagen tetem quefazer força. Esse movimento pode ser uma forte oposição para qualquer governo. Mas uma oposição sensata e coerente.

Há um grande movimento pelo voto útil, para garantir a vitória no primeiro turno...

Acho ruim. Temos que dar essa chance deter uma discussão depr opostas. Esseéoespaç oques obr apara a terceira via, para mim representada na Simone Tebet. O Ciro Gomes tem sua força, masa terceira viaéa Simone. Pela equipe que ela conseguiu engajar, já dá um governo bonito. Acho que agente não pode perdera oportunidade de votar nela.

O ex-presidente Lula foi à Fiesp na terça. O PT demorou para acenar para a classe empresarial?

Trabalhei com seguro a minha vida toda. Você só vende seguros e consegue angariara confiança das pessoas. Se eu fosse conselheiro do Lula, diria para ele: vamos parcialmente fazer mea culpa, falar que teve alguma coisado passadoque não foi bem. Hoje me copiaram numa mensagem com uma reclamação de um segurado. Meu conselho é: primeiro pede desculpa. A gente errou. Com isso eu ganho confiança. Acho que nesse discurso falta dizer que o governo vai ser o Lula 1. E a segunda coisa é dizer que foram feitas coisas erradas e a gente reconhece. Falta isso.

Num segundo turno entre Lula e Bolsonaro, em quem o empresariado deve votar?

Vou responder como se eu fosse político. No segundo turno eu voto na Simone.

É um cenário distante da realidade...

Acho que a Simone tem chance. Acredito que temos tempo para as coisas acontecerem. Fiquei impactado com a escolha da Mara Gabrilli para vice, uma pessoa vencedora, que enfrentou todas as dificuldades e superou pelo lado do trabalho, é uma senadora atuante. A Simone eu conheço de Três Lagoas, onde ela foi prefeita e eu tenho uma fazenda. Vejo que ela tem coerência, história. Acho que a dupla é impactante e espero que isso gere visibilidade.

ECONOMIA

pt-br

2022-08-12T07:00:00.0000000Z

2022-08-12T07:00:00.0000000Z

https://infoglobo.pressreader.com/article/281887302086612

Infoglobo Conumicacao e Participacoes S.A.