Infoglobo

Pix ainda não consegue abalar reinado dos boletos

Forma clássica de pagamentos continua no patamar de 2,2 bilhões por trimestre. Para especialistas, hábito explica isso

GABRIEL SHINOHARA gabriel.shinohara@bsb.oglobo.com.br

Os boletos sempre figuram na lista dos maiores temores dos responsáveis pelas contas das famílias. Apesar de tirar o sono de tantos, ele vai bem e não sente o avanço do Pix, que revolucionou o setor de meios de pagamento, de bancos e finanças. Nas contas de luz, de água e no pagamento no varejo, o boleto ainda se mantém como a opção de milhões de brasileiros mesmo depois do lançamento do Pix, que permite pagamentos instantâneos. De acordo com dados do Banco Central (BC), os pagamentos feitos por boleto ou convênio (a conta emitida por companhias de água, luz e internet) continuaram no patamar de 2,2 bilhões por trimestre, o mesmo verificado antes de novembro de 2020, quando o Pix foi lançado. Bruna Cataldo, pesquisadora do Instituto Propague, ressalta que essa resiliência do boleto pode ser explicada pela natureza do mercado de meios de pagamento. Segundo a economista, o consumidor vê o Pix como uma opção, não algo que vai sobrepor outros meios, até por conta da comodidade e do hábito.

— A pessoa já está acostumada a todo dia 5 pagar seu boleto, há uma resistência à mudança. Não é nem que não aconteça, mas o hábito do consumidor é uma coisa bastante relevante em qualquer transação financeira, principalmente quando já é muito fácil, como o boleto —afirma Bruna.

VANTAGEM DE JUROS E MULTA

O boleto é útil para pagamentos recorrentes como água e luz porque permite a configuração de juros, desconto e multa. O Pix Cobrança, solução do BC para atender a essa demanda, ainda não foi adotado massivamente pelo mercado. Entre as empresas de luz e

No varejo, o Pix conseguiu reduzir a desistência de compra, mas ainda há muito a fazer, diz especialista

pesquisadora do Instituto Propague

água que já oferecem o pagamento por Pix, há a Neoenergia, a CPFL, a Light e a Águas do Rio, mas o código de barras ainda é a opção preferida. Pelo menos para a companhia de água e esgoto que atende parte do Estado do Rio.

Anselmo Leal, diretor institucional da Águas do Rio, aponta que o pagamento por código de barras representa 44% do 1,2 milhão de contas emitidas todo mês. O Pix, por sua vez, é usado em apenas 1,5% dos pagamentos.

Leal explica que essa preferência acontece porque no caixa eletrônico é possível programar o pagamento do boleto para o dia do vencimento, enquanto no Pix o dinheiro sairia da conta na mesma hora.

— A população tem o costume de ir no caixa eletrônico, levar as contas de água e luz, programar todas para os vencimentos e sair do caixa com os comprovantes de

que foram agendadas. Outra parte faz isso no internet banking — afirma Leal, que cita ainda o crescimento do débito automático.

RECUO NO COMÉRCIO

No varejo, a história é um pouco diferente. Apesar de manter um patamar considerável, o número de boletos, excluindo os convênios, caiu no fim do ano passado. De 361,4 milhões em novembro de 2021, passou para 263,1 milhões em janeiro deste ano e subiu novamente para 311 milhões em março.

De acordo com Daniel Davanço, head de Pagamento para empresas do Mercado Pago, o Pix foi bem adotado pelo comércio on-line por trazer algumas vantagens para o vendedor e o consumidor, principalmente pela instantaneidade da compensação.

Com o Pix, a espera média de dois dias para a compensação de um boleto deixa de atrapalhar o lojista, que precisava reservar o produto, e permite que a entrega seja mais rápida.

— Quando a gente olha de lá (antes do Pix) para cá, esses 25% das vendas on-line que eram boleto hoje são de 10%, e o Pix ganhou entre 25% e 30%. Hoje, a cada três Pix que são finalizados, existe um boleto — explica Davanço.

Além disso, ressalta, o Pix diminui as desistências de compra. Davanço conta que 50% dos boletos emitidos acabavam não sendo pagos. Já no Pix esse número fica em torno de 25%, mas ainda há um caminho de desenvolvimento para melhorar a experiência do usuário. Eduardo Terra, presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo, que tem como associadas empresas como Amazon, FastShop e Marisa, aponta que o Pix ainda deve crescer mais fortemente no varejo. O entrave, aponta Terra, é que a ferramenta ainda enfrenta barreiras de implementação da tecnologia. — Para que haja um processo de recebimento de pagamento por Pix integrado num checkout de supermercado e loja, há que se buscar uma série de integrações. A previsão é que isso ganhe escala nos próximos dois, três anos e que o Pix ainda ganhe mais penetração sobre boletos daqui pra frente —relata.

“A pessoa já está acostumada a todo dia 5 pagar seu boleto, há uma resistência à mudança”

_

Bruna Cataldo,

Economia

pt-br

2022-06-26T07:00:00.0000000Z

2022-06-26T07:00:00.0000000Z

https://infoglobo.pressreader.com/article/282029035911943

Infoglobo Conumicacao e Participacoes S.A.