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Licitação para a bilhetagem dos ônibus não atrai interessados

Nenhuma empresa aparece para administrar sistema de arrecadação, o que poderia abrir a caixa-preta do setor

LUIZ ERNESTO MAGALHÃES luiz.magalhaes@oglobo.com.br

Após uma batalha na Justiça que terminou com decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), a licitação para o sistema de bilhetagem eletrônica dos ônibus — que poderá dar transparência ao sistema — não atraiu interessados. Nenhuma proposta para assumir o serviço foi apresentada à prefeitura. Representantes de duas empresas, uma delas administrada por um ex-genro do empresário Jacob Barata Filho, do Grupo Guanabara (principal operador de ônibus do Rio), chegaram a registrar presença na reunião que durou cinco minutos, mas não apresentaram propostas. O município pretende rever o edital e fazer uma nova licitação após ouvir o “mercado”, mas ainda não definiu quando isso acontecerá. Enquanto isso, o controle de toda a arrecadação dos ônibus continua sob a gestão da Riocard TI, ligada aos próprios empresários do setor de transportes.

Para especialistas, o episódio mostra que, apesar de alegar prejuízos, os empresários não querem mudar as regras.

—Mesmo com as dificuldades financeiras, eles estão esticando a corda até a gestão do sistema se revelar inviável, o que pode explicar a ausência de interessados. Uma das origens do problema é que a licitação realizada em 2010 favoreceu os atuais operadores ao permitir a participação da Riocard. Nesse ponto, as empresas estão unidas, apesar de continuarem a disputar passageiros nas ruas, mesmo reunidas em consórcios — diz o engenheiro especializado em mobilidade urbana, Licínio Machado Rogério.

DEBATE COM O MERCADO

O prefeito Eduardo Paes não se manifestou. Em nota, a Secretaria municipal de Transportes disse que “vai debater com o mercado a necessidade de eventuais adaptações que possam ser feitas no edital, antes de republicá-lo”. A estimativa de fontes da prefeitura é que isso possa levar até dois meses, podendo comprometer o cronograma de remodelação do BRT, que deve receber veículos novos a partir do segundo semestre de 2022. Isso porque o município quer começar a mudança da bilhetagem pelo serviço de articulados.

Nessa queda de braço, a prefeitura alega que o sistema é uma caixa-preta porque, como a Riocard TI é ligada às empresas, os dados sobre faturamento e demanda de passageiros não são confiáveis, enquanto os empresários dizem que há transparência. Anteontem, o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), rejeitou uma ação movida por representantes das empresas de ônibus do Rio e da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), que tentava impedir a realização da licitação. O setor já havia ido à Justiça, sem sucesso, para que a Riocard pudesse participar da concorrência, o que está impedido de acordo com o edital da prefeitura.

Para o professor da PUC José Eugenio Leal, especializado em transportes, na revisão do edital, a prefeitura deve prever mecanismos que atraiam o interesse de empresas estrangeiras, ainda fora do mercado carioca:

— Mudar é essencial para o sistema ter mais transparência —diz Leal.

Empresários do setor ouvidos pelo GLOBO após a realização da licitação alegam que o modelo proposto exigiria muitos investimentos e poderia gerar pouco retorno financeiro. Um dos itens do edital previa que a vencedora teria que implantar um novo sistema de cobrança e de manutenção dos equipamentos. Hoje, cada concessionária é responsável por esse mecanismo de bilhetagem. Além dos ônibus, operam pelo sistema gerido pela Riocard TI: o VLT, o metrô, os trens e as barcas.

SETOR PROPÕE AUDITORIA

A proposta do presidente da Federação das Empresas de Transporte do Estado (Fetranspor), Armando Guerra Júnior, é que seja contratada uma auditoria independente para atestar a veracidade das informações prestadas pelo setor:

—O que está em discussão é se o sistema é transparente. Então, vamos auditar os dados. Se, após essa auditoria, ficar comprovado que há falhas, a prefeitura faz nova licitação para a bilhetagem — sugeriu Guerra. — O que existe hoje não é uma crise na bilhetagem, mas na operação por outros fatores como queda na demanda de passageiros e os custos do setor. Se a prefeitura desejar podemos oferecer acesso em tempo real aos dados dos validadores.

Com a maioria das empresas que atuam no Rio em recuperação judicial, o transporte tem sido um transtorno para os passageiros, que mofam nos pontos à espera dos ônibus. Além da espera, enfrentam superlotação e falta de conservação. Centenas de linhas desapareceram durante a pandemia e, mesmo com o fim do isolamento, a maioria não voltou a circular.

Rio

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2021-12-08T08:00:00.0000000Z

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