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Quando um livro ‘negacionista’ abre a porta para outros

Busca na Amazon, em que os próprios autores podem publicar e divulgar obras sem respaldo científico, é impulsionada por algoritmos

GIULIANA DE TOLEDO E RUAN DE SOUSA GABRIEL segundocaderno@oglobo.com.br

Quem busca na Amazon um livro para entender a Covid-19 pode acabar encontrando títulos que desprezam a existência de uma pandemia e duvidam até mesmo do próprio coronavírus e de sua letalidade. Livros assim não são difíceis de achar na versão brasileira da gigante de vendas. Os resultados para buscas com palavras-chave sobre a situação atual levam a essas obras. E, uma vez dentro da página que detalha o conteúdo e as opções de compra na Amazon, mais indicações conspiratórias aparecem.

— A empresa não só lucra com os livros que usam sua plataforma, mas também com a sugestão de livros de conspiração junto a outras compras — diz Marc Tuters, professor da Universidade de Amsterdã que estuda a oferta de desinformação na Amazon junto a um grupo de pesquisadores no projeto Infodemic. Procurada, a Amazon removeu três de nove livros negacionistas brasileiros apontados pela reportagem. A retirada de obras após denúncia tem sido recorrente. Depois da invasão do Capitólio nos EUA, em janeiro, por exemplo, a empresa parou de vender produtos relacionados ao QAnon, teoria conspiratória da extrema-direita. Em nota, a companhia informa que o site do Ministério da Saúde aparece sempre no topo das páginas de resultados de pesquisas por livros relacionados ao coronavírus eque remove títulos que não estejam de acordo com suas diretrizes de conteúdo. Estudiosos ouvidos pela reportagem são unânimes em reconhecer que impedira A maz onde comercializar títulosneg acionistas seria censura. No entanto, todos concordam que a empresa deveria tomar medidas que freassem a propagação de conteúdo anticientífico. Pablo Ortellado, colunista do GLOBO e pesquisador das redes sociais, afirma ser indefensável que o algoritmo não diferencie livros sérios e falaciosos e recomende tanto uns quanto outros.

— Há coisas, que, apesar de legais, são antiéticas, ainda mais no meio de uma pandemia —diz .

Os livros do catálogo da Amazon podem chegar à loja virtual mesmo sem terem uma editora, uma vez que ela é aberta a obras publicadas por iniciativa dos próprios autores. E livros assinados por autores pouco conhecidos podem ter o seu sucesso impulsionado pelo algoritmo do site. Professor da USP e especialista em ética, Eugênio Bucci afirma que quem vende livros negacionistas deveria incluir o aviso, o mais didático possível, explicando que se trata de um produto sem respaldo científico. Algo como o “este produto causa câncer” presente nos maços de cigarro. No entanto, Bucci reconhece que o efeito disso é mínimo.

— Essas pessoas não se incomodam com o fato de um sistema dizer para elas que isso é falso, porque estão engajadas num movimento antiestablishment e isso pode até mobilizá-la mais —adverte.

Segundo Caderno

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2021-05-08T07:00:00.0000000Z

2021-05-08T07:00:00.0000000Z

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